quarta-feira, dezembro 07, 2011

Gostei de ti assim, instrumental.



Havia canções cujos refrões me cansavam. Refrões que eu não quero e não vou repetir. É que, certas vezes, a outra parte não percebe o quão prejudicial para a alma é ser lembrado a cada minuto dos nossos defeitos. São refrões que eu prometi para mim mesmo, não mais cantar. “E desde quando você acha que pode saber mais de mim do que eu?” – é o que tenho cantado. Próxima faixa. Tenho ouvido introduções marcantes. Mas as pontes, os pré-refrões, de tão empolgantes, têm gerado apenas frustração, pois invariavelmente tenho me deparado com refrões difíceis/incompreensíveis. Versos demais, rimas demais, notas difíceis de se alcançar, muitas delas feitas para não serem alcançadas. Se tu esperares demais do mundo, das pessoas ao teu redor, podes ter uma única certeza: a decepção, implacável e impetuosa. “Coração vazio não bombeia sangue”. Eu quero assoviar uma melodia que me lembre alguém, mas eu não sei nem assoviar. Próxima. Próxima. Next! Um dia desses, eis que me invade os fones uma melodia nova. Eu jamais poderia dizer o próximo acorde que viria, pois tudo se desdobrava nos mais intrincados trechos, novas partes, em andamentos diferentes, mudando a cada maldito compasso. Em versão resumida: não consegui te decorar, não sei te tocar, e me pergunto algumas vezes por dia quando é que vou ouvir novamente, essa canção. A música estava no ar o tempo todo, eu é que estava usando fones. Passei o tempo todo despejando notas na tua melodia. Deixa que eu canto. Gostei de ti assim, instrumental.

E eu não paro.



Existe uma estrada sob os meus pés. Ela termina toda vez que chego em casa, tarde da noite. O que vejo após a derradeira parada, é o fim desse chão. Se eu prosseguir em minha caminhada, ignorando quaisquer placas de sinalização e advertências verbais de amigos, sou engolido por esse infinito precipício.

E eu não paro.

A queda, até o momento, não parece ruim, embora eu não negue que me incomoda não saber quando me chocarei com o chão. O ar, utilizei todo ele na tentativa de gritar. Ninguém ouve. Não daqui, onde estou. Eu poderia ficar sentado à borda desse penhasco, observando todos os que, caminhando ao meu lado, decidiram encerrar ali suas jornadas. Desobedeço… sempre. E, uma vez sem ar, resta a mim conferir se me calarei com o impacto ou por apneia. Ansiedade?

E eu não paro.

E quem tentou me seguir ficou pelo caminho, por medo de um ou outro precipício. “O que é que tem ali?”. Antes de me fazer essa pergunta, já me encontro lá.

Às vezes acho que me fizeram capaz de sentir demais. E emanar demais o que é sentido, inclusive quando não faz sentido. E isso assusta, afugenta, por chamar atenção demais. Meus pensamentos são como um farol que não consegue se esconder na praia deserta. Ele sempre estará lá, ao alcance dos teus olhos, te impedindo de naufragar em mim. E não há nada capaz de me apagar.

Só queria, por meia-hora que fosse, me ver diluído no horizonte de uma noite qualquer. Uma dessas em que tu vagas por aí sozinha, trocando pernas, balbuciando impropérios ao vento. E ter o que eu sinto invisível aos teus olhos. Por meia-hora que fosse, te fazer me querer sentir na meia-hora seguinte.

Essa intensidade indesejada de sentimentos atribui imenso valor até mesmo ao mais insuspeito dos teus sinais. E isso, às vezes, torna-se tão pesado a ponto me fazer preferir a sensação de ausência de peso inerente à queda à falsa-segurança da terra firme. Meus joelhos doem, guria, e é por essas e outras é que me atrai tanto o ensurdecedor silêncio do vento frio me cortando a pele. Pelo menos, enquanto caio, tenho certeza de que não me ouves.

Quase sempre eu penso que deveria parar de agir assim.

E eu não paro. Me para.

Sobre coisas que cabem em um mês.



A preguiça física nos impede de mudar. Mas basta uma faísca entre dois neurônios para que nossa mente nos aponte para outra direção. Das duas uma: ou tu segues as novas coordenadas, que te podem levar por terrenos inóspitos e até mesmo campos minados, ou optas por permanecer no curso antigo, ignorando a intermitente buzina que te avisa: “estás no caminho errado”. Não digo “errado” no sentido mais amplo da palavra. Talvez sejam justamente as instruções antigas, as que estavam corretas. Mas acredito que, às vezes, precisamos deparar com um beco sem saída para descobrirmos que o caminho é pro outro lado. A vida já cansou de me provar repetidamente que a escolha certa é justamente a que me parece mais errada. Mas a gente precisa errar. Mas não errar por engano, por distração, displicência. Eu erro com força, e com vontade. Eu erro melhor, para errar menos. E, sim, saio errante pela rua, torcendo pra chuva não me pegar, ou enxarcar cada centímetro da minha pele. Não é que eu esteja deixando a maré me levar, como se fosse plâncton. Eu erro por aí na tentativa de acertar. Depois de perceber que, sempre que acho que estou fazendo a coisa certa, descubro que estou machucando alguém, tenho apostado cada vez mais no que não me parece sensato. Improvável? Vamos. Impossível? Não existe. Impensável? Bora! Sigo a maré das sinapses. Se a mente muda, eu mudo. Somente assim eu posso ser cem por cento sincero com aquele que mais estimo: eu. Egoísta: para caralho, mas se eu não fizer as coisas por mim, sei que minha mãe não as pode fazer, e nem tenho mais idade para isso. Dirijo com o tanque na reserva, mas é para voar baixo. “Tá, mas o que é que cabe em um mês?” – tu perguntas. Um ciclo lunar, uma copa do mundo, duas olimpíadas, um amor de verão, quatro amores de verão…Um mês é o tempo que levei pra escrever denovo. O tempo que minha mente demorou pra mudar o curso da minha alma. Pra onde ela aponta agora? Pra bem longe. Prometo ser mais ágil, da próxima vez.

Eu sou o acidente.



A fumaça que sai dos carros entrelaçados dessa esquina da minha vida promete mais do que o espetáculo cumpre: já assisti a eventos piores. Os motoristas, há tempos já tiveram alta em seus hospitais. Exibo em meu torso parcos arranhões que acidentam o toque da pele, mas essa brusca interrupção de movimento acabou por me privar apenas daquelas preocupações bestas de outrora, que me tiravam o foco e entortavam o caminho. O caminho segue errante e irregular, mas dessa vez os passos são só meus. Sim, livre. No entanto, essa mesma liberdade acaba nos amarrando a uma intensa e incessante necessidade de ter antigas sensações. Quando menos percebemos, já estamos novamente atando o nó do nosso barco em algum outro cais. De novo?  Isso é normal. Em algum determinado grau, somos meros neurônios de um corpo imensamente maior, esperando por uma faísca que nos conecte. Afirmo que estamos sempre, mesmo que imperceptivelmente, procurando conexões. É instintivo dividir sensações, compartilhar momentos, comungar histórias com outras pessoas. O único período em que sentimos dor é o momento em que estamos no vácuo de uma transição de histórias. A última página do capítulo parece pesar uma tonelada, às vezes, mas ela precisa ser virada a qualquer custo, e um outro par de mãos pode ajudar nessa tarefa. Uma vez novamente ligados, a dor se dissipa como a fumaça que esconde as ferragens do acidente. Estamos respirando, e evoluindo. A gente sai de cena com as roupas rasgadas, bolsos vazios e a mente confusa, sem saber como fomos parar ali. Mas e se pudéssemos jogar todos os livros fora e carregar conosco apenas a página do agora? É tão comum a gente se apegar ao passado e viver numa réplica dele, na ilusão de que estamos andando pra frente… no entanto, se tivéssemos realmente sido felizes no processo, jamais teríamos mudado. Então a gente muda. Mas o problema é que a gente muda sentindo medo demais. A gente navega perto da costa, esquecendo-se de que poderia ser bom perder o horizonte, seguir a vontade da corrente e atracar na próxima ilha. Por mais que ela demore a surgir no infinito, ela é nova, e a gente chegou lá sem bússola. Antes de ligar para a emergência, esperei para ver através da fumaça o que realmente acontecera. Um acidente, embora não tão trágico. Um espasmo de vida em um coração que parecia padecer em estado vegetativo. O trânsito voltou ao normal, e eu voltei pra casa, graças a uma carona que eu queria que tivesse durado alguns minutos a mais. Só lembro do rosto através do vidro quebrado.

Meus fantasmas.



Eu já caí, de tanto olhar pro céu. O que me protegeu de espalhar minha cabeça pelo meio-fio da calçada foi o fato de eu sempre andar no meio da rua. Os carros que vêm na minha direção não passam de velozes e barulhentos fantasmas que meus inimigos vivem inventando para me testar. Eles conhecem meus medos melhor do que eu. Eu já me perdi, de tanto olhar pros lados. O que me fez chegar onde estou foi a companhia desejada das pessoas que me são mais importantes, jamais permitindo que eu entalhasse na areia pegadas solitárias. Encontrei caminho e refúgio nas esquinas que a multidão esqueceu de ver, enquanto tentava trazer o horizonte pra mais perto. O tempo passa sozinho, e não há nada que possamos fazer para assumir seu controle. Eu já petrifiquei minhas pernas, de tanto viver o passado. Minhas amarras foram soltas pelo súbito empurrão que você me deu. Me dóem os pés, dor essa que ignoro toda vez que minhas solas encontram novo chão. Os fantasmas, de repente, somem, e a estrada dos meus dias se desenrola em minha frente como um tapete vermelho. Basta que haja equilíbrio. E esse equilíbrio não se dá de olhos fechados, muito menos se olhando por onde anda. Enxergo o auge da minha vida como o equilíbrio na agulha. Qualquer passo descuidado trará o chão para um brusco encontro com a minha face distraída. Não sei o meu próximo passo, mas vivo meus dias e noites em função de fazer com que os meus pés toquem sempre o caminho que eu construí. A gente faz o nosso caminho, e é normal que ele seja estreito e sinuoso. Ninguém consegue andar em linha reta por muito tempo.

Apenas nós.



Certo dia olhei para os meus pés e vi que não mais havia âncoras presas aos meus tornozelos. Noutro dia estava em outro mar, depois em outro, em outro… me acostumei a apenas assistir de longe a segurança da terra firme. Ela já não me atrai mais. Seria essa, a vida que eu sempre procurei? Aí é que reside o cerne da questão. A vida que eu sempre procurei é, justamente, viver procurando. É eternamente cavar fundo até encontrar, em peito alheio, um coração parecido com meu. Tenho desistido da ideia de eterna felicidade. Desisti. Os momentos que a gente chama de bons momentos só são chamados assim porque existem também aqueles que queremos esquecer. Bons momentos são bombas de endorfina que amolecem os espinhos que nos insistem em perfurar as partes onde nossa pele é mais fina. E essas partes são muitas, principalmente quando estamos despidos de armadura (sempre?). Tendo isso em mente, faço o que está ao meu alcance para que esses momentos sejam numerosos, visto que eles jamais são duradouros. Endorfina vicia. Tenho assistido a guerras, e não são as da tevê. Em mares que tangem os meus, existem explosões tentando atrair meus olhos. Explosões que pulverizam no ar todo tipo de sentimentos nocivos, perigosos. Quando tudo na nossa vida está em seu devido lugar, não nos passa pela cabeça a ideia de propalar aos quatro ventos essa falsa felicidade. Muito menos, os espinhos, que são de verdade. Forjada com lágrimas contidas, a felicidade anunciada se derrete com a chegada do primeiro sinal do amanhecer. Eu já fui para longe, e te deixo ir, contanto que não olhes mais para trás. Não com essa cara, e não com essas palavras escritas na testa. Como é que tu pretendes lidar com isso? Conheço mil formas de se proceder; mais da metade delas parecem mais sensatas, ao meu ver. Nessa constante mudança de mares, tenho fugido para cada vez mais longe da fumaça dessas explosões. Hoje, distante a ponto de te ver como um minúsculo ponto próximo à curva do horizonte, encontro-me às portas de uma nova vida, aquela vida que eu sempre procurei: viver procurando. A memória recente de uma longilínea silhueta ornada pelos iluminados prédios da metrópole, mesmo sendo fruto de um mero retrato imaginário e possivelmente efêmero, tem me guiado para longe da tua guerra. E para cada vez mais longe da terra firme. Aqui a água é fria, e a hipotermia me força a dar braçadas cada vez mais convictas, em sentido oposto ao dos teus passos.
Mortos um a um, restam apenas os feridos: eu e tu.

Sejamos maiores.



O que é prever o futuro, senão fabricá-lo com as próprias mãos? Prever o futuro é moldá-lo com atitudes, inspiradas nos mais ousados sonhos. Não consigo lembrar de cabeça o nome de alguém que realizou seus sonhos sem ter, para isso, passado por todo tipo de obstáculos. E eu me encontro frente a uma antiga muralha que há anos se coloca em meu caminho. Paredes escorregadias de limo que não se deixam ser escaladas. Obstáculo. O que há do outro lado? Não sei. Mas não é do meu feito ficar aqui, parado. Digo isso porque há muito tempo conclui que não existe nada mais valioso do que um objetivo em mente. Um sonho, por que não? O sonho nada mais é do que uma realidade que pode assumir qualquer tamanho e forma que a gente conseguir imaginar. Se meus pensamentos conceberem uma jornada sem fim, sem objetivo aparente, ou até mesmo sem sentido, seria uma grande auto-traição não realizá-la. Não fomos dotados da capacidade de sonhar por acaso. Use-a. Sejamos maiores. Tenhamos CORAGEM. Escrevo em maiúsculas por acreditar que essa é a única palavra que precisa realmente ficar nos olhos de quem está lendo isso. É uma luta em que ninguém vai entrar no ringue pela gente. NINGUÉM. Depender apenas dos próprios punhos é assustador, mas a cada obstáculo transposto, a gente aprende que – sempre – pode mais. O sangue que deixarmos espirrar será lembrança eterna do quão longe chegamos. Eu sei qual é o meu futuro. Cabe a mim construí-lo. A dor no peito daqueles que tiveram medo é infinitamente maior que a dor de quem tentou e caiu.

Permita-se.



Mas por que é que nós, ao mesmo tempo em que fugimos do que não nos fere, acabamos nos jogando, despidos de qualquer armadura, aos leões? A resposta muda de tempos em tempos na minha cabeça. O que penso hoje e aqui escrevo é que, por mais que a gente negue, a gente tem umas poucas certezas. A gente TEM QUE TER essas certezas. Poucas e importantes certezas. O PASSADO É INSIGNIFICANTE. Sim, ele é o espelho da nossa história e conta muito sobre o que somos. Mas o que eu sou depende muito mais do que eu estou fazendo agora, do que das coisas que eu fiz. Nós temos o poder de mudar, a qualquer momento da nossa existência, para melhor ou para pior. A única coisa que importa é o futuro, que nada mais é do que uma página em branco que a gente pode preencher com as tintas que bem entendermos. Tirando das costas o fardo do passado, encontramos nos nossos pés a leveza necessária para saltos no futuro, cada vez mais altos, arriscados, excitantes e, sim, felizes. O presente nada mais é do que o momento em que passado e futuro se beijam. Esse encontro de lábios dura um tempo ínfimo, intangível, mas é suficiente para transformar o agora em história. E como é a minha história? O que é que eu quero ter pra contar? E a gente pode DEVE ser maior. Basta que a gente queira. E querer não é poder, como as pessoas dizem por aí. QUERER É FAZER. E fazer não é nada fácil. Existem momentos na vida em que a gente precisa ser mais forte do que acha que pode, mais inteligente do que acha que é e mais nobre do que acha que consegue. E como é que a gente consegue? Querendo. E quando a gente quer demais uma coisa, a gente é capaz de feitos que a nossa mente nem consegue conceber. A gente mata um leão por dia. A gente acaba esquecendo das poças d’água, canalizando toda a nossa força para o embate inevitável com os predadores que a vida coloca na nossa frente. E são muitos. Os sonhos são objetivos que a gente re-batiza desse jeito apenas para que pareçam inatingíveis. E o nosso salto pode ser do tamanho que a gente conseguir imaginar. Basta que a gente perca o medo de molhar os pés.

Asma.



Todos os nossos pensamentos e atitudes são como uma encomenda anônima que a gente faz pro destino. Inconscientemente, queremos que nossas ações desencadeiem uma série de acontecimentos cujo roteiro já foi definido na nossa cabeça. Antes dos 10 anos a gente aprende: não é assim. A gente costuma achar que o mundo inteiro pensa da mesma forma que a gente. A gente costuma achar que somos amados pelos mesmos motivos pelos quais amamos. Mas se as rosas que eu jogo ao vento te ferem como flechas, de quem é a culpa? Minha que não é. Por essas e outras é que as pessoas vivem doentes, na incessante busca pelos 100% de satisfação. A gente apelida essa utopia de ‘amor perfeito’, de ‘amor de verdade’ e de inúmeras coisas, como se o amor – puro e simples – não fosse o bastante. E o amor – simples, sem adereços – já é tão complexo, tão raro, que muitos que conheço já se aproximam dos 30 sem saber o que é. A gente ama e, inconscientemente, encomenda um amor igual. O que nos bate a porta não é menor, não é pior, é diferente. É o amor que um outro alguém construiu, esperando receber em troca um espelho do que sentia.

Novo.



Mais uma cidade. Novo ar. Uma casa nova, no mesmo lugar. No entanto, acumulam-se teias de aranha naqueles cantos da nossa alma que a gente tem medo de mexer. Sempre tive medo de mudar a ponto de não me reconhecer em escritos antigos, espelhos empoeirados. Então eu volto ao estado inicial, aquele de anos atrás. A gente sempre acaba voltando pro cassino. Mas o jogo é outro, mais difícil, imprevisível e com uma aposta mínima que a gente simplesmente não tem como pagar. É o mundo ensinando a gente que ainda não deixamos de ser os adolescentes cheios de dúvidas que éramos. A diferença é que somos maiores que outrora, e em nossas cabeças há ainda mais espaço para mais e mais questionamentos. Quanto mais claro fica para mim a noção do que é certo, mais meus pés apontam para o obscuro caminho do absolutamente desconhecido. Não posso dizer que não gosto. Mas também não direi que tem sido simples. E o que é simples, aos vinte-e-tantos anos? A gente se sente velho demais para jogar tudo pra cima e fugir. A gente se vê jovem demais pra dar o próximo passo sem olhar pra trás. Então a gente fecha os olhos e caminha até cair. A cada vez que ergo meu corpo, percebo nos pés descalços a textura de um novo chão, na pele o toque de um vento que vem de outro lugar, e que traz consigo outros aromas. Um deles, em especial, me captura o olfato, prendendo-me numa não-intencional caçada sem espingarda em punhos. É o momento em que meu peito pode ser perfurado pela mais insignificante flecha de papel. É sua, aquela silhueta turva dois quarteirões adiante? Por quê sozinha? Seria apenas na minha cabeça? Tenho acordado de sonho nenhum, tenho dormido apenas pra ver se paro de sonhar…E é tão real, o pesadelo de perder o discernimento pra sempre. Mais uma cidade. Novo ar. Uma casa nova, no mesmo lugar.

Enquanto você dormia.



A pedido das palavras que, presas entre os dentes e a língua, são privadas da reverberação pelo ar. Atendendo ao clamor dos pensamentos que, cansados de ricochetear no pequeno vestíbulo ao qual mantenho-os confinados, ora por medo, ora por preguiça, ou então sem motivo aparente, aqui escrevo. Obedecendo a ordem que meu coração me deu de voltar a escrever sem métrica, tempo ou medida, sem melodia, sem ritmo nem rima, aqui e agora, eu volto a borrifar ao vento os sentimentos que não consigo cantar.

Aeroporto.



Chegadas e partidas.
Eu sou um aeroporto. Na verdade, todos nós. Que outro lugar, senão um aeroporto, condensa sob o mesmo teto a alegria do encontro e a tristeza da despedida? Vejo pedaços de mim acima das nuvens, em logradouros distantes, em cidades inóspitas. Recebo, também, de todo lugar, pedaços do mundo que, como ímãs, aplicam-se sobre a minha pele e lá ficam para a posteridade, exibidos por onde passo. Alguns têm a pista embrenhada entre matas, encoberta por nuvens de chuva, radares desligados ou intencionalmente sabotados. Tem gente que tem medo de avião. Por medo das partidas, tem gente que não deixa ninguém chegar. São aeroportos fechados. No entanto, a gente só percebe o calor do abraço quando sente a dor de respirar o ar frio da solidão. Você brada aos céus toda sorte de impropérios, mas não percebe que vôo nenhum te encontra no radar. Eu sou um aeroporto. Chegadas e partidas são a única certeza na minha vida. Meus olhos estão virados pro futuro, focados na estrada que se prostra à minha frente. Encontro em mim, com igual facilidade, motivos para persistência ou para desistência. E continuar pra quê? Continuo com a força do que levo pra vida. O saldo positivo disso tudo é a quantidade de aviões que acolho em meus hangares. Pedaços de histórias que conto pra mim mesmo todo dia, enquanto ergo um tímido sorriso quase que instantâneo de realização.

E você, aeroporto em greve, tá esperando o quê, olhando pra cima?
(Avião não pousa em aeroporto fechado)

Encontrei você.



Os lugares que eu visitei durante a infância hoje chegam a parecer claustrofóbicos, em novas visitas. Eu cresci. As quinas não estão mais protegidas, muito menos está a minha cabeça, que trafega na velocidade do pensamento pelos mais sinuosos caminhos. Mas o conforto das linhas imaginárias, associado à inércia causada pelo medo do desconhecido, faz a gente parar de procurar. Medo de bater, a gente tem. Bater, ás vezes, a gente bate, inclusive. No entanto, os anos passam e pouca coisa muda. É um choro ligeiro, um curativo e, após isso, apenas mais um lugar pra gente tomar cuidado da próxima vez. A gente precisa trafegar no território desconhecido pra aprender que ele é tão previsível quanto o quintal de casa. A única certeza que a gente tem que ter é a de que a próxima esquina pode guardar, SIM, aquilo que a gente mais procura. E, amigos, aquilo que a gente mais procura jamais está em nosso quintal. Das duas, uma: ou está na rua, ou no quintal de outro alguém. Então a gente corre, entra sem bater, por vezes até invade propriedade alheia, na busca daquilo que a gente nem tem muita certeza do que é. Só não podemos esquecer de que as quinas estão lá. Na época eu não sabia, mas descofiava: um dia eu seria maior do que as paredes do quintal de casa. E foi bem longe dele que eu encontrei  o que procurava.

Sejamos importantes, eternos, e sem preço.



Nenhum ser humano é capaz de viver sem afeto. Se você acha que sim, pode fechar os olhos, pois você já morreu. Eu quero que meu impacto nas pessoas seja sutil como a colisão de dois caminhões em sentidos opostos. Sinto que já passou da hora da gente descarrilar trens, afundar barcos, trazer ao chão os aviões. Que a marca vire cicatriz, e que todos que passarem por mim a levem consigo em suas peles, mas que não haja dor. Que as explosões nos pulverizem em pequenos, mas importantes pedaços, incrustrados nos corações daqueles que cruzarem o nosso caminho. Sejamos importantes, eternos, e sem preço.

Mutável.



Os minutos que a gente tem juntos viram dias e semanas em câmera lenta, dentro da minha cabeça, toda vez que o elevador desce contigo dentro. Meu coração está vazio, sem mobília. Mas tudo que eu preciso agora é de espaço pra te construir dentro do meu peito, com as poucas peças que tenho em mãos.Com quem estou ao telefone? Com a saudade, que há muito não vejo. Ela está chegando, e não parece ter planos de ir embora tão cedo. Eu aguento. Basta que feche os meus olhos e dê play numas poucas horas de filme, e uma mísera foto sem resolução no meu celular. Cá estou eu, do alto do meu sexto andar, perdendo o controle, de novo. Tudo acontecia devagar. Tudo que ela fazia parecia, aos meus olhos, acontecer em câmera lenta. Nada mudou: continua tudo mudando a todo minuto.

Viva seu último romance.



Tenho escrito menos. E vivido um pouco mais. A literatura de meus dias perdeu o caráter de microconto, por isso não mais os tantos posts. Virou romance que não mais se capitula em poucos parágrafos. Muitas vezes abandonei em branco o texto, pois olhava, míope, para dentro de mim e nada via senão o nebuloso vulto da ulceração que ainda gritava em vermelho. Precisava encontrar um caminho para a superfície, mas no fundo daquele poço encontrei um par de lentes. O romance nos desafia a convicção, por vezes tira a paciência, e pode até nos subtrair alguns anos da vida, mas quando é que alguém, por um segundo que fosse, cogitou – a sério – viver sem ele? Nossas aspirações vão, cada vez mais, aproximando-se da realidade; a gente passa a prometer menos, mentir menos, e chega até a achar que, dessa vez, erraremos menos, por julgarmos saber onde escondem-se todas as bombas desse campo minado. Nem preciso lembrar que a única certeza no romance é a de se estar eternamente em apuros, saracoteando as pernas para não se deixar afundar totalmente no obscuro e indecifrável oceano que é a vida daquela pessoa com a qual estamos de mãos dadas. Em apuros pois é perigoso. É perigoso porque a gente arrisca. E a gente arrisca porque quer. Ninguém nos obriga a viver o amor, mas a gente ama vivê-lo. Ninguém nos obriga a sentir as mesmas dores de novo, mas a gente se quebra em mil pedaços para sentir o prazer na cura. A gente acha que pode viver sem, mas as palavras soluçadas no fim de uma noite ébria evidenciam o que, para todos ao nosso redor, já era óbvio: estamos fodidos. Em apuros não estou só eu, estamos todos nós, meus caros. Romance é o que se persegue pelas esquinas, que foge à luz dos postes, e ele está bem. Em perigo estamos nós, nesse apuro que reside na nossa urgência em vivê-lo. Vivê-lo, mesmo que torto, inacabado, ferido, precipitado, errado, proibido, ou impossível. Vivê-lo de verdade, com intensidade e sem escudos. Como deve ser, e como inevitavelmente é, quando nosso coração nos dá aquela única e inevitável rasteira que nos faz quicar no chão.
Viver o romance é estar em apuros.
Estou vivendo, e não quero ser salvo.

Eu-eu-comigo.



Quando lutamos contra nós mesmos, somos os únicos a colecionar feridas. Até que ponto vale a pena ater-se ao caminho da menor-dor, do baixo risco e do conforto calculado? Você grita para si mesmo com tanta força essa mentira, que acaba por não ouvir o peito clamando por um segundo de atenção. Mas eu consigo ouví-lo, quando ele encosta no meu, e sigo aguardando o dia em que a tua garganta, de tão rouca, deixe chegar aos teus ouvidos o que para mim fica claro toda vez que teus olhos fecham antes dos meus: é recíproco. Eu poderia dizer que fui acometido por uma abstinência de sensações às quais já estava acostumado. É o que você sempre diz, mas eu ainda não me acostumei a você. Por isso que eu sempre volto, mesmo quando a minha autoestima implora para que eu espere por um sinal teu. Teus sinais foram dados; nós é que falamos línguas diferentes, quando o assunto é sentir e expressar.

Feito por mim, para você.



A cidade está vazia.
Eu não reconheço mais esses rostos.
Falta algo.
Falta você.
Falta aquela felicidade que eu sentia quando estava contigo.

O frio da manhã que eu tento suportar enquanto não tenho suas mãos nas minhas.

A vida está vazia.
Eu não reconheço mais o meu rosto.
Falta algo.
Falta você.
Falta o sorriso que você arrancava de mim quando dizia que adorava estar comigo.

Meio engagado assim, você segue em mim.

"Tá chegando?"
"É dobrando ali."

Será que dobrando ali eu posso te encontrar?
Esse ali nunca chega.

"Você ainda me ama?"
"Ainda e pra sempre."

Deve ser
pra sempre.
Pra
sempre
De
ve
Ser.

Não sei mais usar a primeira pessoa do singular.
Só existe a primeira pessoa do plural.
Pessoa escrita, reescrita e verbalizada.

Inquebrável.
De alguma forma.
Pra
sempre
In
que
brável.
Imutável.

Depois de tantas idas e vindas (você sempre indo e eu sempre voltando)... Algo permaneceu uma vida inteira. A nossa.
Continuo com a mesma saudade e o mesmo amor. A mesma saudade e o mesmo amor que aumentam todos os dias.
Te encontrarei na minha próxima existência.

Missão não-cumprida.




E foi falhando na tentativa de salvar o romance de seu eterno apuro que me descobri inapto a viver com a cabeça leve. Quanto mais fundo cavamos em busca de significados perdidos, mais difícil e utópica se torna a nossa volta para a superfície. O podre se apega a nós, nos persegue, nos tira a razão e a infinita corrida em direção à luz nos faz perceber em profundidade que estamos TODOS – sem exceção – perdidos como náufragos ao mar. E a luz, sempre à frente, inalcançável, guiando-nos pelo seu trajeto torto e cheio de armadilhas.

Felizes os ingênuos, os burros, e os filhos-da-puta.

Percebo o peso da idade quando sinto em minha mente a presença de cada vez mais pensamentos aos quais eu não posso – ou não consigo – dar vazão. Sempre tive facilidade na hora de traduzí-los em parágrafos, mas esse artesanato leva tempo, é cansativo e, certas vezes, quando finalmente deglutimos um assunto, já somos atropelados pela urgência de uma vida que somos obrigados a viver, do abrir ao pregar dos olhos. A vida passa fulminante enquanto escrevemos sentindo e avaliando o peso de cada palavra. Incapazes de expressar mazelas e exorcizar demônios criados por nós mesmos, adoecemos em lenta morte, infeccionados pelos nossos próprios defeitos.

Escrever aqui foi o que me impediu de fechar os olhos a essa luz. Esbravejar por escrito – mesmo que para destinatários que desconheço – é confortante, justamente quando não me serviam mais as opiniões sensatas. Digo isso porque, afinal, lá no fundo, a gente sempre sabe quando tá fazendo merda. E é nesse ponto que eu discordo de quem diz que somos, essencialmente, bons e puros de espírito. Na verdade, compactuo com a hipótese de que, se não exercermos controle firme sobre nossos pensamentos e atitudes, transformamo-nos em nada mais do que o lodo do lodo. O erro está na nossa alma, e cada descuido é um curativo para as mais-de-mil chagas que se espalham por sua superfície.

Descobrir-se imperfeito, defeituoso e incapaz (e escrever sobre isso) é o que me impede de desmoronar. Essa obra inacabada que todos somos precisa de andaimes, estacas e apoios para se manter de pé. Família, amigos, músicas, drogas… usamos o que temos ao nosso alcance, embora saibamos que jamais estaremos prontos. Jamais.

Viver é perigoso. O mundo é veloz, cruel, e cheio de arestas. Só está a salvo quem está morto. 

quinta-feira, outubro 27, 2011

Assinado eu.



Lembro de uma fixação latente por mãos. Talvez ela nem saiba que tem mãos ansiosas. Ela não quer saber de uma porção de coisas. Talvez saiba demais. Talvez eu a tenha deixado saber demais. De boca fechada, meus olhos gritam mais alto que o barulho da tevê que ilumina o quarto. Lembro de fechá-los por vontade própria, a fim de que ela não me visse despido de tudo que eu crio pra que ela não preste muita atenção em mim.
Distrações. Uma grande orquestra tocando uma pequena canção. Detalhes singelos que ganham proporções quase épicas. As mãos ansiosas. Lembro de jogar pedras naquela janela para, quem sabe, enxergar através das brechas algo que me mostre que eu não sou o único perdendo a razão aqui, nesse sofá. Sinto que somos como dois carrosséis que giram em sentidos opostos. Eu não quero saber o que acontece quando estamos de costas um para o outro.
Há pouco estávamos aqui, enxergando um ao outro de uma distância que pode ser medida com os dedos de uma mão. Em meu carpete, marcas de sapatos que viajaram o universo procurando sentir aquilo. E eu senti tudo aqui, quieto. Fechava os olhos sempre que sentia os meus pensamentos tentando saltar através das órbitas. Tive medo de vê-los derramados pelos lençóis, de vê-la olhando atônita para aquilo tudo, como se não fosse capaz de ouvir os meus olhos gritando.
Já tive sentimentos imensuráveis. Imensurável também era tudo que vinha agregado ao fato de sentir algo que não cabe no peito. A orquestra foi perdendo, aos poucos, seus membros mais importantes, até que o desfalque era tamanho que me feria os ouvidos. Uma desafinada sinfonia, sem melodia nem cadência, conduzida por um maestro que não está mais lá. Hoje minha filarmônica ensaia um movimento diferente, que eu tento chamar, mas não consigo, de distração. Uma grande orquestra tocando uma pequena canção.
E a música dela é nova, é rara, é curta, e quase nunca toca no meu gramofone. Mas é no mesmo tom da minha. Ela parece não saber que cada nota ficou na minha cabeça, como uma partitura escrita pelas paredes da minha casa. Ela parece não querer saber. Mas cá estou eu, sempre falando um pouco demais.
Porra, guria. Porra. Quem te escreveu assim?

Por ti e por você.



Quantas vezes desviei o olhar, simulei estar procurando alguém por entre você. Mexi no cabelo, mordi os lábios, tudo porque talvez não pudesse te responder o que eu realmente pensava.
E no teu silêncio sonoro, quantas outras vezes te procurei por escrita digitando e apagando, perdendo tempo ao trocar o ‘você’ por ‘ti’ e o ‘ti’ por ‘você’. Quer dúvida mais idiota?
Me desculpe, mas sinto dizer que estive colocando-o a teste. Quando você pediu ‘fica’ eu quis ir e fiquei só para confirmar que estava certa. E eu estava, deveria mesmo ter ido.
Já deveria ter aprendido a confiar mais na minha desconfiança, mas aí você fica martelando na minha cabeça… E a simples lembrança de vê-lo sorrindo e me tomando nos braços, compromete toda a armadura.
Queria estar coberta de razão quanto a todo o restante e, dessa vez, por uma única vez, estar absolutamente enganada quanto a ‘ti’.

O certo e o incerto, a gente vai saber.



Tenho um sincero apego a tudo que me arrebata e esse tudo, no caso, é tão pouco.
Talvez eu pedisse pra minha vida ser sempre uma via de duas mãos; talvez eu quisesse dormir e acordar balbuceando reciprocidade, só pra variar um pouco. Talvez eu quisesse que fôssemos bons um para o outro e não somente o outro pro um. Acho que gostaria de perder mais tempo contigo, seria bom perder a noção dele também. Queria que você quisesse saber quem eu sou além da casca, por dentro, lá no fundo. E então eu te contaria que quis ser veterinária, que o meu pai é a pessoa que mais amo no mundo e que várias vezes quis ouvir tua voz mas não liguei. E te diria que o meu peito ainda dói, mas que ele sabe amar. Queria que você não tivesse medo de me dizer quem é além do supérfluo e que parasse de fazer as coisas só porque quer me agradar. Queria te ver perdendo o controle um pouco, queria que você se perdesse um pouco mais em mim.

Queria te ver não racionalizando.
Queria vincular teu nome a um pronome possessivo.
Queria que você quisesse, porque eu finalmente deixei alguém entrar.

Todas estrelas estão desaparecendo.



Cansei de lutar contra mim mesmo, pois já me cobrem o corpo feridas em diferentes fases de cicatrização. Aqui estou, pronto para me aplicar com mais algumas doses cavalares de você, se assim me permitir. E eu já não mais vivo sem essa morfina que eu batizei com o teu nome, há alguns meses atrás.

Epifanias III.



Será que existe algo mais emocional do que optar por ser racional, por medo de errar novamente? E o que é mais racional do que permitir que essa emoção guie cada um dos nossos passos? Às vezes são tão altas as vozes de fora, que a gente acaba não ouvindo o peito gritando. O meu peito é que gritou alto demais, calando as vozes de fora. Epifania. Compreensão súbita. Era como se estivesse tua imagem estampada em tudo que vejo. E aquela presença permanente no meu pensamento me fez percorrer a extenuante e perigosa trilha que me leva de encontro a ti.

Complexidade mal entendida.



Ela o amava. Sem complexidades ditas ao silêncio dos olhos ou dilacerações ao luar. Amava-o só pelo prazer de amar. Quando estavas, vivia de sorrisos. Quando não estavas, simplesmente vivia. Ele a amava. Sem temor de ser garoto demais para tanto mistério que irradiava dela. Amava-a para ter paz. Nela via toda a cor de um mundo onde tristeza não era bem-vinda, e ficava por lá, sereno, feliz. Não havia buquê de rosas espalhados pela sua casa, tampouco cartas apaixonadas escondidas na cabeceira da cama. O amor deles era assim, manso. Vezenquando uma batida forte na janela faziam pratos voarem e gritos ecoarem pelas paredes da sala - para logo depois transformar-se em afagos de perdão. O amor deles era assim, intenso. Quem os observava caminhando pela rua com as mãos entrelaçadas, ou sentados com os braços roçando de tão perto na mesa do bar, distribuindo sorrisos para qualquer um que viesse, enxergava que ali havia encaixe talhado à mão. O amor deles era assim, transparente. Todas as noites, debaixo do lençol, ouvia-se sussurros apaixonados vindos até o sono chegar, aqueles sussurros eram sempre o mesmo, um desejando estar com o outro o mais breve possível.

Procura-se.



Talvez não caiba a mim encontrar o paradeiro do romance perdido. É que ele não me escapou pelos dedos desatentos, não está ao relento entre o meio-fio e os carros, não se esvaiu junto às memórias de uma madrugada ébria. Me corrói as entranhas cogitar a hipótese de que talvez jamais tenha, de fato, existido aquilo que tenho procurado. Me perfura os pulmões a constatação daquelas coisas que, mesmo quando assumidamente prováveis e esperadas, eu – ingenuamente – negava até o fim que pudessem acontecer: As piores verdades são aquelas que parecem mentira.
Mas então o que é a verdade, se não tudo aquilo em que acreditamos com todas as nossas forças, até o fatídico momento em que não cremos mais? As verdades mudam, e as tuas o fazem numa velocidade que acredito que ninguém seja capaz de acompanhar. Justamente, por medo disso, tratei de despir meus sentimentos de poesia. No entanto, as nossas situações, mesmo nuas de significado, mesmo ceticamente analisadas com a frieza de um cirurgião, teimavam em rabiscar sorrisos na minha cara. Sorrisos que não saíam em água corrente. Mesmo assim, tenho vivido ao pé da letra o ‘dia-após-o-outro’, jamais adornando os dias com os meus costumeiros exageros que conheço bem. É difícil manter os pés no chão enquanto a mente voa.
Talvez o que me compete seja justamente diagnosticar a completa inexistência do romance, ou constatar que trata-se de um bobo conceito hipotético. Uma ideia que nos inspira, que nos motiva, que nos estufa o peito através de um brusco sopro do mais puro nada. Uma isca que nós, mesmo após fisgados sucessivas vezes, seguimos mordendo, constantemente e com convicção. E eu mordi mil vezes e vou morder outras duas mil, justamente por acreditar na ínfima chance de – somente por uma vez – aquilo tudo não ser uma mentira. As piores mentiras são aquelas que parecem verdade.

Hipotermia.



Como é que tu pretendes lidar com isso? Conheço mil formas de se proceder; mais da metade delas parecem mais sensatas, ao meu ver. Nessa constante mudança de mares, tenho fugido para cada vez mais longe da fumaça dessas explosões. Hoje, distante a ponto de te ver como um minúsculo ponto próximo à curva do horizonte, encontro-me às portas de uma nova vida, aquela vida que eu sempre procurei: viver procurando. A memória recente de uma longilínea silhueta ornada pelos iluminados prédios da metrópole, mesmo sendo fruto de um mero retrato imaginário e possivelmente efêmero, tem me guiado para longe da tua guerra. E para cada vez mais longe da terra firme. Aqui a água é fria, e a hipotermia me força a dar braçadas cada vez mais convictas, em sentido oposto ao dos teus passos.

Desistir.



Tenho desistido da ideia de eterna felicidade. Desisti. Os momentos que a gente chama de bons momentos só são chamados assim porque existem também aqueles que queremos esquecer. Bons momentos são bombas de endorfina que amolecem os espinhos que nos insistem em perfurar as partes onde nossa pele é mais fina. E essas partes são muitas, principalmente quando estamos despidos de armadura (sempre?). Tendo isso em mente, faço o que está ao meu alcance para que esses momentos sejam numerosos, visto que eles jamais são duradouros. Endorfina vicia.

De noite, você verá de perto.



Falhas dilaceradas e lamentadas. Vozes espalhadas e bem colocadas. Saudade que consome todo o seu você que não o pertence mais. A vontade de mudar é mutável e em vão.

Dois.



Enterre todos os seus segredos na minha pele. Desapareça com inocência, e deixe-me com meus pecados. O ar ao meu redor ainda parece uma gaiola e amor é somente uma camuflagem para o que parece ser raiva novamente...

Sem você, não.



Só lembro do rosto através do vidro quebrado. Esquecer? Não consigo. Repensar? Não quero. Reviver? Não aguento. Roteiro pros próximos capítulos? Não tenho.

Meu novo lar.



Eu poderia dizer o que já repeti em refrões antigos: que sou “alguém pra ocupar o lugar / de quem não vai voltar”. São palavras que me saltam da língua e param nos dentes, sempre que sinto medo de que você confirme a minha hipótese. Então eu sigo o teu conselho de me ater apenas às tuas ações. E assim eu sigo, tirando da tua boca frases impensáveis, do teu peito, o calor que eu preciso e, da tua vida, tudo que vai de encontro aos teus planos de não me deixar entrar. Aluguei um espaço no teu pensamento e me sinto confortável aqui, embora nada me garanta que eu não possa ser despejado. Se for pra ser, que assim seja: o frio da rua é mais confortável do que um lar onde já não se quer mais morar. E faz tempo que eu me mudei, jogando fora as chaves da antiga morada.

Espinhos.



Amor, tenho de te pedir desculpas. Eu não sei disfarçar, eu não sei caminhar sem o sorriso torto que você escupiu em meu rosto, não mais. Amor, qual é a graça de manter os pés nessa terra depois que você me apresentou lugares tão mais altos? E, meu bem, eu conheço doze personalidades numa pessoa só, mas eu não conheço uma completa. Eu vejo uma pessoa que arde à noite e que tem medo do escuro. Eu vejo uma alma bordada de flores e um coração feito de vidro. Mas eu posso enxergar a crueldade nos teus olhos, eu consigo ver a força que você carrega nas costas. Será que sou a única que sente tua pele ardente e teu coração gélido? Só eu que enxergo uma rosa em forma de anjo que se diverte nas horas vagas cortando os mais desavisados com seus espinhos pontiagudos? Eu fui um dos desavisados, amor. Eu tenho as marcas dos seus espinhos até hoje. Eu tenho uma marca que eu chamo de desejo e uma que me perturba sempre que eu chamo de saudade. A pior é a que eu chamo de veneno. Essa nos mantém vivos. Essa é anestésico, remédio e droga. Essa é a que mais se parece contigo. É tão profundo quanto você e quase tão intenso quanto. Essa com certeza é você.

quinta-feira, outubro 20, 2011

Não me deixe matar você.



Quando Ana me deixou - essa frase ficou na minha cabeça, de dois jeitos - e depois que Ana me deixou. Sei que não é exatamente uma frase, só um começo de frase, mas foi o que ficou na minha cabeça. Eu pensava assim: quando Ana me deixou - e essa não-continuação era a única espécie de não continuação que vinha. Entre aquele quando e aquele depois, não havia nada mais na minha cabeça nem na minha vida além do espaço em branco deixado pela ausência de Ana, embora eu pudesse preenchê-lo - esse espaço branco sem Ana - de muitas formas, tantas quantas quisesse, com palavras ou ações. Ou não-palavras e não-ações, porque o silêncio e a imobilidade foram dois dos jeitos menos dolorosos que encontrei, naquele tempo, para ocupar meus dias, meu apartamento, minha cama, meus pensamentos e todas essas outras coisas que formam uma vida com ou sem alguém como Ana dentro dela.
Quando Ana me deixou, eu fiquei muito tempo parado na sala do apartamento, cerca de oito horas da noite, com o bilhete dela nas mãos. No horário de verão, pela janela aberta da sala, à luz das oito horas da noite podiam-se ainda ver uns restos dourados e vermelho deixados pelo sol atrás dos edifícios, nos lados de Pinheiros. Eu fiquei muito tempo parado no meio da sala do apartamento, o último bilhete de Ana nas mãos, olhando pela janela os dourados e o vermelho do céu. E eu continuei por muito tempo sem salvação parado ali no centro da sala que começava a ficar azulada pela noite, feito o interior de um aquário, o bilhete de Ana nas mãos, sem fazer absolutamente nada além de respirar.
Depois que Ana me deixou - não naquele momento exato em que estou ali parado, porque aquele momento exato é o momento-quando, não o momento-depois, e no momento-quando não acontece nada dentro dele, somente a ausência da Ana.
Porque entre as pontadas na cabeça, o nojo da boca do estômago e os olhos inchados, principalmente às sextas-feiras, pouco antes de desabarem sobre mim aqueles sábados e domingos nunca mais com Ana, vinha a certeza de que, de repente, bem normal, alguém diria telefone-para-você e do outro lado da linha aquela voz conhecida diria sinto-falta-quero-voltar. Isso nunca aconteceu.
Um pouco depois desses dias que não consigo recordar direito - nem como foram, nem quantos foram, depois daqueles dias começou o tempo em que eu queria matar Ana dentro de tudo aquilo que era eu, e que incluía aquela cama, aquele quarto, aquela sala, aquela mesa, aquele apartamento, aquela vida que tinha se tornado a minha depois que Ana me deixou.
Mandei para a lavanderia os lençóis verde-clarinhos que ainda guardavam o cheiro de Ana - e seria cruel demais para mim lembrar agora que cheiro era esse, aquele, bem na curva onde o pescoço se transforma em ombro, um lugar onde o cheiro de nenhuma pessoa é igual ao cheiro de outra pessoa.
Por todas essas coisas, talvez, é que nestas noites de hoje, tanto tempo depois, quando chego do trabalho por volta das oito horas da noite e, no horário de verão, pela janela da sala do apartamento ainda é possível ver restos de dourados e vermelhos por trás dos edifícios de Pinheiros, sempre tenho a estranha sensação, embora tudo tenha mudado e eu esteja muito bem agora, de que este dia ainda continua o mesmo, como um relógio enguiçado preso no mesmo momento - aquele. Como se quando Ana me deixou não houvesse depois, e eu permanecesse até hoje aqui parado no meio da sala do apartamento que era o nosso, com o último bilhete dela nas mãos. Palavras que dizem coisas duras, secas, simples, arrevogáveis. Que Ana me deixou, que não vai voltar nunca, que é inútil tentar encontrá-la, e finalmente, por mais que eu me debata, que isso é para sempre. Para sempre então, agora, me sinto uma bolha opaca de sabão, suspensa ali no centro da sala do apartamento, à espera de que entre um vento súbito pela janela aberta para levá-la dali, essa bolha estúpida, ou que alguém espete nela um alfinete, para que de repente estoure nesse ar azulado que mais parece o interior de um aquário, e desapareça sem deixar marcas.

Que outubro me traga o melhor.



As pessoas seguram uma risada quase de pena. Mas se ele nem morava aqui, mas se ele não ficou mais do que uma semana com você, mas se já faz tempo que ele se foi, sem nunca ter sido.  Então o quê? Nem eu sei. Mas sei da minha enxaqueca que já dura uma semana. Latejando sem parar. O coração que subiu nos meus ouvidos. Gritando que sente falta e pronto. Eu sinto falta de ligar o celular, depois do avião aterrissar, e ter uma mensagem sua dizendo que vai dar tudo certo. E sorrir mesmo estando numa fila gigantesca para o táxi, embaixo daqueles 78 graus do Rio de Janeiro. Não tem poesia nem palavra difícil e nem construção sofisticada. O amor é simples como sorrir numa droga de fila. E não se sentir mais sozinho e nem esperando e nem desesperado e nem morrendo e nem com tanto medo. Eu sinto falta de querer fazer amigos em qualquer festa, só pra conhecer gente estranha e te contar depois. Agora, eu fico pelos cantos das festas. Voltei a achar todo mundo feio e bobo e sem nada a dizer. Porque eu acho que estava gostando mais das pessoas só porque te via em tudo. Agora as pessoas voltaram a me irritar. E eu voltei a ter que fazer muita força pra sair de casa. Quando alguém não entende o meu amor, eu lembro daquele dia que você não queria tocar violão pra mim. Até que dedilhou reclamando que não era o seu violão. Daí tentou uma música conhecida. Tentou uma menos conhecida. Daí tocou uma sua, com a voz baixinha e olhando pro nada. E então me encarou e cantou com a voz alta. E então largou o violão, me encarou e cantou bem alto a sua dor, de pé, na minha frente, e eu achei que meu peito ia explodir. E naquele momento eu pensei que poderíamos ser infinitos se fossemos música. E isso explica tudo, mas ninguém entende. Você entende. Mas cadê você?

Doar, doer.



– É que nessas coisas de amor eu sempre dôo demais…
– Você usou o verbo ‘doer’ ou ‘doar’?
(Pausa)
– Pois é, também dá no mesmo…

Penny.



Ele era… Não sei. Tinha um brilho que vinha lá do fundo da alma, sabe? Um ímã que me atraía e intrigava, tudo ao mesmo tempo. Eu queria tocá-lo, apertá-lo, degustá-lo por inteiro, e sabia que jamais seria o suficiente. Era uma daquelas pessoas que iluminam o mundo só por existir. Palavra alguma teve o poder de encaixá-lo completamente, sempre sobrava algo mais que não poderia ser esquecido. Então pensei que estava sendo real demais, comum demais. Por certo, ele não era real, tampouco comum. Dentro de si morava algo surreal, mágico.

Amor poesia.



Não disseste palavra alguma que me prometesse eternidade, parentesco ou viagens até a lua, mas me fizeste sentir que tudo o que sentia era recíproco, o que por si só, já me levava aos ares. Não fizemos planos à meia luz, mas sei que estou em todos os teus, como estás nos meus. Eu sei que toda a minha lágrima será limpada pelos seus dedos trêmulos de preocupação, assim como sabes que toda sua angústia será sufocada em meu abraço com todo o carinho do mundo. Deixamos para o destino decidir o que fazer conosco. Enquanto ele pensa, nós nos amamos e nos queremos. Você me ensinou da forma mais sorridente e cheia de suspiros que amar é sorrir. E quando me disseste no meio da noite “sussurra o que te faz sorrir”, falei teu nome em voz baixa e sonolenta. Senti seu sorriso iluminar o quarto, e soube que era a resposta certa.

Reflections of a Skyline.


Naufrágio.



Que tolice a tua pensar que o vento sopra de acordo com a sua maré. Seu barco naufragou por entre esses mares perigosos por onde tu andavas com a convicção de que a correnteza traria umas flores de outono de volta. Seu barco afundou, mas ainda tens a esperança de que ele ressuscite; eu sei disso só pelo transbordar de sua alma. Esse seu barco foi para o cais há muito tempo e nem fez questão de me esperar. Como sempre os seus percursos são mal acabados. Começam e de vez em quando se estendem por aí, mas não se arrostam por entre as bordas, tendo o fim de pararem no meio do caminho. Disso tenho certeza porque o seu amor foi sempre pela metade. Beijos sempre mal colocados nessas linhas irregulares do nosso amor, balbucios irritantes sob meus ouvidos. Sempre se esqueceu de colocar as dores para fora. Como de costume, as impregnou no peito, para nunca tirá-las dali. Sempre se esqueceu de compartilhar os momentos de fala arriscada. Como o habitual, teve seus gritos interiores, só para si. Posso te garantir que esses eram os seus defeitos mais asquerosos e únicos, por sinal. E por que eu teria de esperar alguma coisa de você? Nunca me satisfez. Ainda bem que tomei a frente e peguei o meu barquinho e fui só, apenas eu-eu-comigo. Tomei a frente e deixei as civilizações do nosso amor bruto para trás.

If I'm James Dean, you're Audrey Hepburn.



Tenho me perdido nos confins do tempo. Já não sei mais se sou passado, presente ou futuro. Tornei-me confusão. Falta-me a pausa, a vírgula - o fôlego que me encoraja a preencher as linhas vazias. Falta-me o ar. Procurei no guarda-roupa, mas só encontrei palavras desconexas que me tornaram ainda mais confusa. Enrolei o tapete, encontrando apenas marcas de poeira feita em páginas novas. Juntei-as com as palavras, formei frases que me tirassem a confusão. Nada. Ainda me faltava algo. A pontuação! Ora, onde estava? Revirei toda a casa, só encontrei pedaços de mim que me atormentavam. Decidi ir para as ruas. Encontrei você. Nada tinha nos bolsos além de reticências - a continuação jamais terminada. E desde então vivemos assim, eternos.

Coração não é tão simples quanto pensa.



Eu te achava único, das formas mais absurdas e belas. Em todos os lugares te encontrava, e mesmo assim, tinha certeza de que jamais verei alguém como você. Era confuso demais, complicado demais, não entenderias, então deixava para lá, sempre te enxergando em histórias e lugares que sempre teimava que nada tinham de semelhantes consigo. Mas insistia, porque sabia muito bem que te vejo como nenhuma outra pessoa nesse mundo ou em outros conseguirá ver. Via-te mau humorado e impaciente, sabendo que não havia melhor companheiro para me aguentar numa noite sem vontade de sair ou conversar - noites silenciosas eram compreendidas por ti, que tanto sabia dessa minha vontade de ser tudo e não me sentir nada. Via-te arrogante quando pensavas estar certo, com aquele seu olhar de eu-sei-tudo-de-tudo-e-você-nada-sabe. Com a certeza de que nada sabias sobre meu modo de te amar, querendo tudo e tentando não querer absolutamente nada por medo de te assustar. De repente não existe mais fronha colorida ou texto à ser escrito. De repente, estou num mundo onde só existe sua presença e minha vontade de dedicar-lhe esse amor que, apesar de tão humano ser, não deixava de ser belo, de ser nosso. Anulo tudo à minha volta para tentar fazer esse amor caber nessa sala.

Quando você apareceu.



Entrastes em minha vida à passos lentos, de fininho, quase sem deixar rastro no assoalho, e em pouco tempo já via marcas de mãos na parede, meias jogadas no cesto e sua camisa favorita esquecida no abajur ao lado do sofá. E você deixou de se esconder em sua cara de brabo que dizia não-me-importo-com-isso, e passou a usar aquela cara de você-faz-isso-só-pra-implicar que tanto me faz rir e te abraçar dizendo que se não fosses exatamente como sou, não virias. Algumas tardes me pego pensando nos motivos para aceitar sua entrada sem mais nem menos em minha casa. Nos dias em que estás presentes, penso que fora o destino, e nada mais poderia fazer além de permitir entrar na casa que era tua desde muito antes de me conhecer. Eu sinto aqueles braços capazes de aquietar minha alma, vejo aqueles olhos que me pedem carinho tão inocentemente, e sinto aquele cheiro capaz de me acelerar o peito. De todos os laços rompidos, cartas queimadas, noites de sexta perdida na ânsia de encontrar alguém minimamente perto de sua perfeita imperfeição, você chegou. Chegou e te quis. Te quis e me quiseste de volta.

Epifanias II.


Quando já não sei mais para onde te levar, vejo que não sou apenas eu, tampouco apenas você. Somos um só, compartilhando duas vidas entrelaçadas pelo destino - o acaso não seria tão exato assim. E mesmo quando se vai, você não parte. Você permanece - dentro de mim.

Tu e eu.



O mundo nunca girou tão rápido desde que nos perdemos de nós mesmos. Acho que sempre estivemos fadados ao novo começo, você aí, eu aqui. Juntos.

Com certezas.



Quem gosta, gosta. Sem complicações. Sem armações e armaduras.

Amando em um silêncio gritante.



Quando acho que não tenho mais nada pra falar, simplesmente me calo e amo-te quieta, em segredo. Só pra mim.

6h34



Quero a curva silenciosa da tua boca fazer ruído no meu lábior inferior desajustado.

Sua falta.



Um dia eu volto pra falar pra você todas as verdades que terei que inventar pra preencher o vazio que terá que me sustentar durante toda essa ausência.

Aonde está você agora além de aqui dentro de mim?



Sumiu. Sumiu como se o vento tivesse levado. Sumiu o bom, sumiu o mau. Sumiu sem deixar recado. Sumiu sem desligar o rádio. Sumiu sem agonia, ligeiro. Sumiu o bonito e o genial. Sumiu mudo e de repente. Sumiu sem pôr amor. Sumiu em despedida sem adeus. Sumiu em alforria. Sumiu para o desconhecido. Sumiu de todos. Sumiu daqui.

Pois sou tão você.



Senta aqui. Me diz. De onde sai esse pensamento que te escurece, que me descolore em sua frente, ofusca toda a minha imagem e me coloca atrás de paredes? De quantas formas precisaria provar sentimentos, vontades, razões e forças que saem de dentro de mim para que você entendesse que longe ou perto estaríamos sempre juntos? Saiba. Me disseram sobre o tempo, sobre as circunstancias, a distancia e as poucas ocasiões que a gente teria para estar junto. Mas, se em seu pensamento corre a frase "ele não vive comigo". Me diz, pois eu quero te ajudar a sonhar, se lembrar todos os dias que estou vivo em você, assim como bem pertinho, você vive em mim.